sábado, dezembro 02, 2006

Candida Höfer no CCB

O BES, mecenas da fotografia em Portugal, em conjunto com o CCB convidaram Candida Höfer (n.1944) a fazer o projecto “Em Portugal” do qual resultou a exposição inaugurada hoje no CCB.

Shelley Rice, docente na Universidade de Nova Iorque é a autora do texto, “Depht, Contained”, do catálogo que acompanha a exposição. Exactamente o texto sobre o qual versou a sua conferência de há dois dias

Shelley Rice, nova-iorquina de gema, a 11 de Setembro de 2001 passeava na rua com os seus alunos numa zona da cidade, não muito longe das Torres Gémeas, quando se deu o inesperado ataque terrorista. Foi a primeira vez na história que os Estados Unidos da América sofreram em casa um ataque daquela natureza. Pearl Harbour tinha sido terrível mas longe e Shelley não consegue esquecer essa experiência de destruição. Quando, para escrever o texto, se debruça sobre a vida de Höfer, que cresceu numa Alemanha em ruínas, entende o porquê das suas fotografias. Interiores de instituições públicas desertas de pessoas, as suas fotografias congelam os espaços que, amanhã, como as torres gémeas, podem vir a desabar em minutos,. Shelley só agora tem consciência como a vida é tão precária: “não é só a minha vida, que pode terminar de repente de um dia para o outro...”. Gosto desta ingenuidade americana, mas Shelley tem razão quando dá importância ao passado de Höfer. No meio das ruínas, Höfer cresceu também sob a luz do teatro onde os seus pais trabalhavam. De facto, perante as fotografias que conhecemos de Höfer, podemos perguntar: o teatro acabou, mas as luzes ainda estão ligadas – para quem?...

Na Academia de Düsseldorf, Höfer já fotógrafa experiente, estuda fotografia com Bernd Becher de1976-1982. Quando questionados (Bernd e Hilla) sobre o que ensinavam respondem, “Exposições, livros...” Possuir um conhecimento histórico é essencial e incutem nos seus alunos a importância e necessidade da consciência da história. Traços comuns são visiveis nos seus discípulos. Os temas que normalmente têm a ver com a realidade pública e social e o rigor na documentação. “Nenhum dos alunos dos Becher modifica os espaços em que entra; eles não querem intervir mas sim documentar um momento fugaz em que certos pormenores se destacam no curso do tempo...”, lemos no texto de Wulf Herzogenrath, no catálogo da exposição Distância e Proximidade, que passou também por Portugal.

No final da conferência de Shelley Rice, acima referida, Margarida Veiga, da administração do CCB e acompanhante de Höfer durante a realização do seu trabalho em Portugal, testemunhou-nos isso mesmo, afirmando nunca a ter visto modificar fosse o que fosse para compôr a fotografia, assim haver sempre recusado qualquer sugestão de modificação. Já nem todos seguem à risca este preceito.

Em Março de 2005, na Caixa Geral de Depósitos da Culturgest do Porto, a exposição, “Distância e Proximidade”, mostrou trabalhos do casal Becher e dos seus discípulos.


As fotografias de Höfer estavam expostas na cave,


nas antigas caixas fortes, local antigamente fechado a sete chaves para não deixar ninguém entrar,

tal como Höfer também não deixa entrar ninguém nas suas fotografias. Paralelismo simbólico. Os interiores dos espaços públicos, tema das suas fotografias, e o espaço onde as suas fotografias foram expostas, antiga caixa forte de um banco público, interrelacionavam-se mutuamente: tão exinta a funcionalidade inicial do espaço da exposição como existintas eram já também as funções das construções que os Becher, mestres de Höfer, tão cuidada e meticulosamente fotografaram ao longo de uma vida inteira. Uma pequena distinção, talvez, entre mestres e discípula: Höfer parece pressentir sempre a proximidade de remodelação dos espaços que fotografa como se estes estivessem aguardando, a todo o momento, uma inevitável “modernização”. Para os Becher, o trabalho é puro inventário, sendo-lhes indiferente o futuro das edificações, desde que, naturalmente, inventariadas, fotograficamente, fiquem _ para todo o sempre.

Duas notas finais:

1- As fotografias apresentadas na Culturgest eram quase todas de 1991, fotografadas a cores, com película 200 ASA, e de pequeno formato (35,5 x 51,5 cm).


Na exposição do CCB, Höfer parece não só ter aumentado os formatos ( “antes de mais, impressiona a escala das imagens...” , como se diz no início da crítica à exposição do jornal Público, de hoje), como também alarga os temas, de acordo com o já visto na citada Conferência: os espaços fotografados já não respeitam apenas e tão só instituições culturais mas, ao contrário do que até agora sucedia, englobam outros diversos tipos, como seja, inclusive, espaços de entertenimento, como o caso dos espaços públicos do novo Casino de Lisboa. Recomendo: não se deixem impressionar demasiado pela escala, vamos ver o que nos espera “Em Portugal”.

2- “Distância e Proximidade” fez parte de uma série de exposições, genericamente designada, “Fotografia na Alemanha de 1850 até hoje”, organizada pelo Instituto para Relações com o Estrangeiro, de Estugarda, e exposta em Portugal em vários locais, entre os quais o CCC (Centro Cultural de Cascais).

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